A frase “Não podemos e não devemos ignorar o suicídio” do diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS) Tedros Adhanom Ghebreyesus, é um apelo e ao mesmo tempo um alerta por que de acordo com o órgão, a cada ano, cerca de 800 mil pessoas cometem suicídio e um número ainda maior tenta colocar fim à própria vida. Isso significa que o suicídio, anualmente tem provocado mais mortes que HIV, malária ou câncer de mama e até mesmo, mais que guerras e homicídios, conforme relato da própria OMS.
No recente ciclo de palestra sobre prevenção ao suicídio realizado na Beneficência Portuguesa, especialistas discorreram sobre a importância da prevenção e alertaram, inclusive, para a necessária atenção e suporte psicológico aos profissionais da área da Saúde.
O presidente da Instituição, Ademir Pestana, responsável pela abertura da programação enfatizou: “…tão importante quanto estar atento aos sinais é dar apoio às pessoas, especialmente àquelas que apresentam mudanças repentinas de comportamento, de humor, de rotina; aquelas que usam frases que mostram profunda tristeza e desencanto pela vida, como por exemplo, “a vida não vale a pena” e outras formas de chamar atenção para sua tristeza. Temos que ficar atentos porque essas pessoas não querem colocar fim à sua existência, mas acabar com a dor, com o problema que lhe atormenta ao ponto de tentar ou cometer um ato extremo. Por isso, ‘Setembro Amarelo’ é uma campanha diária”.
As palestras destinadas aos colaboradores do hospital foram realizadas pelas psicólogas Juliana Perez Sabino e Luciana França e pela equipe da ONG AFAPM – Apoio à Família Policial Militar,
“O medo sem resposta e a dor real”
“O corpo parece sucumbir
Parece que abandona a alma
Sensação de vazio invade
De uma solidão dolorosa
São dores que apertam o corpo
Corpo então comprime o espírito
Reduzindo forças
Sufocando o ímpeto de vida
Que condensada ainda respira”
As estrofes acima abrem o poema descritivo de uma pessoa presente à palestra de abertura, cuja dolorida e assustadora vivência na clausura da angústia que se apodera de pessoas em situação de vulnerabilidade, impotente para gerir naquele tempo sua própria vida, bem como seus problemas e resoluções, e que entregues à sua solidão, tenta abreviar a vida para botar fim ao sofrimento, físico e/ou psicológico.
Cuidando dos outros – “Qual o significado da vida? O que te leva a levantar da cama todos os dias, deixar sua família e se dirigir ao hospital para cuidar dos outros?” Com essas perguntas a neuropsicóloga Juliana Perez Sabino iniciou um bate papo com a plateia quase inteiramente formada por profissionais da Saúde, logo entendeu o foco da palestra: a necessidade de se cuidar para cuidar de outras pessoas.
“Os profissionais da Saúde não escolhem de quem vai cuidar e se estão em condições para isso. E na pandemia da covid-19 ainda em curso, vivem o contraditório: de um lado, os protocolos de segurança, o isolamento de familiares e amigos, e por outro lado o convívio direto com os pacientes, vivenciando de perto o risco de serem contaminados pela doença, mesmo assim, não pararam de trabalhar porque a vida prossegue no seu ciclo natural.” Disse a palestrante quetambém é psicóloga clínica e hospitalar, e trabalha com pessoas portadoras de doenças crônicas e familiares enlutados. Ela discorreu sobre a necessidade de atenção aos sinais, especialmente ao questionamento: o que leva uma pessoa a querer tirar a própria vida?
Roda de conversa – Luciana França, psicóloga que integra a equipe do Departamento de Gestão de Pessoas e Ambiente de Trabalho da Prefeitura de Santos, propôs uma roda de conversa com a plateia para uma avaliação sobre a valorização da vida. Com o bate papo aberto pelo vice-presidente da Beneficência, Dr. Renato Luiz Rodrigues Novaes, a psicóloga que é docente no curso de Psicologia da Unip e faz parte do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio demonstrou como é difícil avaliar o sofrimento alheio, seja de criança, jovem, adulto ou idoso.
“Não se consegue ler o pensamento do outro por isso é complexo avaliar seu sofrimento, da mesma forma que acreditamos que ninguém entende a nossa dor, por isso a campanha Setembro Amarelo objetiva informar as pessoas sobre o suicídio, alertar e dar a devida importância à depressão, um dos gatilhos para o ato. Vários são os sinais de alerta e muitos suicídios poderiam ser evitados, mas a questão é complexa e delicada pelo tabu que ainda cerca o tema. Por isso precisamos falar mais sobre o suicídio, avaliar mais a sobrecarga emocional especialmente junto aos profissionais da saúde que precisam estar em equilíbrio para cuidar de si em primeiro lugar” destacou Luciana que respondeu a várias perguntas sobre o tema.
Uma árvore, várias vidas – A equipe da ONG AFAPM – Apoio à Família Policial Militar levou uma proposta diferente para o ciclo de palestras. Apresentou um vídeo sobre a origem da campanha Setembro Amarelo, música e uma atividade lúdica com base em uma história sobre as quatro estações do ano, descritas como o ciclo da vida. Uma árvore desenhada (tronco e galhos secos) à disposição da plateia que a encheu de flores e frutos concluiu a atividade. A psicóloga Margarida Teresa de Jesus Cereja e a assistente social Ana Lúcia Carlos Pereira fizeram uma analogia sobre a importância de enfrentarmos as mudanças e nos apoiarmos nos momentos difíceis e que juntos somos mais fortes.
A equipe formada ainda pela presidente da ONG, Renata Marcondes da Silva que explanou sobre a entidade e a jovem Isabela Carolina Marcondes que deu seu contundente e emocionante depoimento sobre sobreviver a uma tentativa de suicídio e a partir de então incentivar as pessoas na luta contra a prisão dos pensamentos suicidas. A palestra em forma de reunião em cine pipoca (na apresentação do vídeo, pipoca para a plateia) foi apresentada em duas ocasiões para os colaboradores do período noturno. O ciclo de palestras se desenvolvei em quatro dias contemplando colaboradores dos diferentes turnos de trabalho do hospital.
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